Conceituando Região em sala de aula
Publicado: 14 de outubro de 2015 em 6º ano, 7º ano, 8º ano, 9º ano, Brasil, Conceituação e teoria, Cultura, Ensino FundamentalTags:Categorias de Análise, Ensino Fundamental, Geografia, Geografia escolar, Região, regiões, regionalização
Antes de discutir como ensinar o conceito de região, naturalmente é importante que se tenha definido tal conceito. Embora tenha profunda afinidade com a corrente da Geografia Crítica, optarei aqui pela concepção de região mais utilizada pela Nova Geografia. Segundo Roberto Lobato Corrêa (Região e organização espacial. São Paulo: Ática, 1990), esta concepção é de que a região “é definida como um conjunto de lugares onde as diferenças internas entre esses lugares são menores que as existentes entre eles e qualquer elemento de outro conjunto de lugares”.
Opto por tal definição por duas razões. A primeira é a própria leitura da região pela Geografia Crítica. Historicamente, esta corrente relegou o conceito de região a um segundo plano, desconsiderando-o enquanto categoria de análise espacial; além de ter dado ao conceito de região um enfoque exclusivamente econômico, o que automaticamente reduz seu sentido e sua utilidade enquanto categoria. A segunda razão é o conjunto das necessidades existentes, em sala de aula, sobre o uso da região enquanto categoria de análise que colabore para que o aluno (em especial aquele do Ensino Fundamental) compreenda a organização espacial contemporânea. Nesta condição, a definição da Nova Geografia me parece suprir, com algumas adaptações, as necessidades escolares.
Tais adaptações busco na Geografia Humanístico-Cultural, para quem a região é um elemento espacial ligado à identidade do grupo que o habita. Assim, com a junção de tais definições, chego à seguinte conceituação: região é uma porção do espaço, relativamente homogênea, que se diferencia, por tal homogeneidade, dos espaços que a cercam. Tal homogeneidade é relativa e comparativa, ou seja, não é de se esperar que os mesmos elementos que caracterizam a região sejam encontrados, com a mesma disposição e a mesma quantidade, em toda a sua extensão. Entretanto, é de se esperar que tais elementos estejam dispostos e abundem na região de forma tão característica que se tornem destacados em relação à sua disposição e quantidade em outros espaços.
Desta forma, tenho para mim que a região é uma categoria de análise multiescalar (sendo possível regionalizar uma cidade ou o mundo), que as regiões são mutáveis (em vista do dinamismo espacial) e que é possível regionalizar de diversas formas um mesmo espaço (de regiões biogeográficas a regiões econômico-produtivas, por exemplo). Esta aparente complexidade não se concretiza quando aplicamos tal conceito em nossas práticas de análise geográfica, de forma que (ao menos a meu ver) região é a categoria de análise geográfica mais simples de se compreender, especialmente em sala de aula, como veremos.
Em sala de aula: conceituar para poder regionalizar
Da mesma forma como, para discutirmos regionalização, precisamos compreender o conceito de região, o professor deve esperar o mesmo das turmas para as quais leciona. Quando e como fazer isso?
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) de Geografia propõem que no quarto ciclo do Ensino Fundamental (8º e 9º anos), o conceito seja abordado. Nos objetivos propostos, consta:
compreender as múltiplas interações entre sociedade e natureza nos conceitos de território, lugar e região, explicitando que, de sua interação, resulta a identidade das paisagens e lugares.
Discordo parcialmente de tal proposta. Acredito que o ideal seja tratar o conceito de região ainda no terceiro ciclo, ou de forma introdutória a posteriores estudos sobre a geografia regional brasileira, ou logo após a abordagem sobre o conceito de lugar. Isto porque o conceito de região pode ser uma importante ferramenta para o aluno “organizar” sua própria interpretação do espaço geográfico.
Pois bem. Dito isso, como ensinar o que é região? Como sempre proponho, acredito que o melhor a fazer é começar perguntando aos alunos o que eles sabem sobre o tema. Perguntar quais regiões eles conhecem, e o que significa essa palavra, pode trazer respostas interessantes e servir de boa introdução ao tema.
Posteriormente, o professor pode apresentar uma definição simplificada do conceito, de forma oral e escrita. Tal definição deve ser ao mesmo tempo compatível com o significado que se dá ao conceito e com a linguagem e a capacidade de interpretação da turma. Um bom exemplo de definição é: uma região é um conjunto de lugares, perto uns dos outros, que tem alguma coisa em comum, que os torna parecidos.
Aqui, já é possível explorar o conceito através das informações que os alunos conhecem, através de perguntas como: se vocês fossem dividir a cidade de vocês em regiões, como vocês dividiriam? Tem regiões industriais, comerciais, residenciais, de preservação ambiental nessa cidade? É possível dividir essa cidade de acordo com alguma outra característica? Essa cidade, junto com as cidades em volta, formam uma região? É sempre positivo questionar também o porquê das respostas que surgem, de forma que os alunos justifiquem aquilo que estão opinando sobre o espaço.
Num passo posterior, o professor pode, de acordo com os conteúdos propostos para aquela turma, explorar outros exemplos de região. Por isso proponho que o conceito de região seja abordado imediatamente antes de se estudar a regionalização brasileira. Desta forma, o aluno põe em prática o uso do conceito aprendido, utilizando-o como categoria de análise. De quebra, é possível observar como há inúmeras diferenças na forma de se regionalizar o Brasil. Ao longo das aulas, conforme se avança o estudo sobre o território brasileiro, o professor pode explorar as formas como o país pode ser dividido. Por exemplo, as divisões em domínios de natureza (de acordo com a classificação biomorfoclimática de Aziz Ab’Sáber), em regiões técnico-científico-informacionais (de acordo com a classificação de Milton Santos), em regiões geoeconômicas (de acordo com a classificação de Pedro Geiger, ou em regiões sócio-político-econômicas (de acordo com a classificação do IBGE).
Comparando as diferentes regionalizações do Brasil, é possível ao aluno compreender que uma região não é um lugar fechado às interações com o que há ao seu redor. Ao contrário, um mesmo local pode ter características de várias regiões, a depender do critério adotado. É interessante que o aluno perceba também que as regiões não necessariamente coincidem com as fronteiras e limites desenhados nos mapas políticos, pois a regionalização extrapola as delimitações territoriais. Assim é possível, por exemplo, que uma cidade de fronteira tenha mais características que a tornem semelhante a uma região de um país vizinho, do que a regiões em seu próprio país.
Por fim, espera-se que, sob domínio do conceito de região, o aluno consiga desenvolver melhor sua compreensão da organização espacial, seja do território brasileiro ou de sua própria cidade. Com o tempo e o desenvolvimento de novos conteúdos, o conceito de região deve permitir que o aluno observe a forma como a economia, a cultura, os elementos naturais, a política, etc., moldam e fragmentam o espaço geográfico, na mesma medida em que o unificam.
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